O dragão não tem medo da águia
Publicado em 23 de abril de 2025, em Cuba en Resumen
O presidente Donald Trump impôs pesadas tarifas à China, sem perceber que não é o mesmo tratar Pequim neste século XXI da forma como os Estados Unidos fizeram com o Japão na década de 1980.
Em seu afã de debilitar a China, país que Washington observa como seu principal inimigo econômico e político, Trump lançou uma guerra de tarifas para os produtos que importa dessa nação, que foram subindo de 20% a 145%. O gigante asiático respondeu impondo 125% aos produtos estadunidenses importados ao seu país.
O porta-voz do Ministério de Assuntos Exteriores da China, Lin Jian, declarou que Pequim não está interessada em uma luta, «mas não temerá, se os Estados Unidos continuarem com suas ameaças tarifárias.
«Nunca ficaremos de braços cruzados, olhando como se priva o povo chinês de seus direitos e interesses legítimos, nem para ver como se solapam as normas econômicas e comerciais internacionais e o sistema comercial multilateral. Se Washington insistir em continuar uma guerra tarifária ou comercial, a China lutará até o final», acrescentou.
O Ministério de Comércio do gigante asiático sentenciou que “as supostas tarifas recíprocas dos Estados Unidos à China são infundadas e representam um assédio unilateral […] a ameaça de escalada tarifária agrava seu erro e expõe sua natureza chantagista, algo que a China jamais aceitará”.
Essa mesma política de coerção foi imposta por Washington contra o Japão na década de 1980, durante o governo de Ronald Reagan, que naquele momento via esse país como a principal ameaça para manter sua hegemonia econômico-financeira mundial.
Quando Reagan assumiu o cargo, em 1981, Washington começou a pressionar Tóquio a abrir seu mercado às companhias estadunidenses e reduzir o desequilíbrio comercial entre os dois países.
O Japão admitiu primeiro algumas medidas, como a limitação dos autos que exportava para seu principal sócio político e econômico, mas a campanha contra o país no Congresso e nos meios de comunicação continuou, por medo de que tirassem o poder comercial dos Estados Unidos.
Isso levou a que, em 1985, por agressivas pressões da Casa Branca, cinco países (Estados Unidos, República Federal da Alemanha, França, Reino Unido e Japão) firmassem o Acordo da Praça, por meio do qual se desvalorizava o dólar frente ao iene japonês e ao marco alemão.
Como era de se esperar, isso provocou um aumento das exportações de produtos estadunidenses e uma redução do seu deficit comercial com os dois países.
Os economistas Joshua Felman e Daniel Leigh, em um informe para o Fundo Monetário Internacional (FMI), explicaram que “as exportações e o crescimento do PIB do Japão estancaram essencialmente na primeira metade de 1986”, e, para acabar de rematar seu perigoso adversário, em 1987, Washington impôs tarifas de 100 % sobre as importações japonesas em um valor de 300 milhões de dólares, o que praticamente lhe bloqueou o mercado estadunidense, e a economia do país asiático colapsou.
Ao aumentar o valor do iene, os produtos japoneses se tornavam cada vez mais caros, e os países rejeitavam a que tinha sido uma potência da exportação. Os esforços do banco central nipônico para manter baixo o valor do iene provocaram uma bolha no preço das ações, e o país entrou numa recessão que durou uma década. Dessa forma, eliminou-se o perigoso adversário comercial.
Mas no século XXI a situação es muito diferente em relação à China, pois esse país não depende dos Estados Unidos para manter e impulsionar suas produções e comércio internacionais.
O gigante asiático conta com um poderoso desenvolvimento científico, industrial, comercial e econômico, com relações com mais de 180 países no mundo aonde pode enviar suas mercadorias e, ao mesmo tempo, receber variados produtos; além de uma população de 1 bilhão e 417 milhões de habitantes com alto poder adquisitivo.
Portanto não depende dos Estados Unidos para seu desenvolvimento, como, sim, acontecia com o Japão na década de 1980.
Além disso, conta com enormes riquezas em seu território. Por exemplo, possui 40% das terras raras do mundo, um grupo de 17 elementos utilizados nas indústrias de defesa, veículos elétricos, energia e eletrônica. Os Estados Unidos têm apenas uma mina de terras raras, e a maior parte de suas provisões provém da China.
A esta guerra comercial lançada de Washington, Pequim respondeu com a suspensão das exportações de minerais críticos e ímãs, componentes fundamentais para os produtores de automóveis, fabricantes aeroespaciais e empresas de semicondutores.
Sete categorias de terras raras, incluídos artigos relacionados com o samário, gadolínio, térbio, disprósio, lutécio, escândio e ítrio, foram incluídos no controle de exportações. Isso significa um duro golpe para numerosas empresas de ponta estadunidenses, que utilizam, em suas produções, esses elementos importados da China.
As autoridades do país asiático expressaram que as contramedidas às ações de Washington têm como objetivo não apenas proteger sua própria soberania, segurança e interesses de desenvolvimento, senão também manter a justiça e a imparcialidade internacional e o sistema comercial multilateral.
Acrescentaram que, se os Estados Unidos desejarem falar, a porta permanecerá aberta, mas o diálogo deve realizar-se sobre a base do respeito mútuo e da igualdade. Se, ao contrário, quiser lutar, a resposta continuará até o final. A pressão, as ameaças e a coerção não são a forma correta de tratar com a China.
Moral da história: tratar com a China neste século XXI não é o mesmo, para os Estados Unidos, que o que fez com o Japão na década de 1980. Os tempos e as condições são diametralmente opostas, e Washington poderia ser o grande perdedor.
O dragão não tem medo da águia.
(*) Jornalista cubano. Escreve para o diário Juventud Rebelde e o semanário Opciones. É autor das obras “La Emigración cubana en Estados Unidos”, “Historias Secretas de Médicos Cubanos en África” e “Miami, dinero sucio”, entre outras.
Ilustração: Adán Iglesias Toledo.
Tradução: Marcia Choueri